Percebi que o estalo de meu tornozelo se equivalia à mesma dor que vinha sentindo na mandíbula. Dor pelo cansaço. No caso do maxilar, pelo cansaço da mente. No pé, o do corpo. Dentro das horas, que tendem a se alongar na mediocridade dos dias, o desencontro foi inesperado, bem como a falta de apetite, ainda que venha perdendo peso há pelo menos três meses. E nisso, o inusitado: o moço grisalho dançando no ônibus, que quase me fez sorrir. Devia ter uns 40 anos, por aí. Proletário, trabalhador uniformizado do pescoço às botas pretas que calçava. Estimo a idade por uns e outros cabelos brancos, inclusive na pouca barba que ostentava, porque sendo daquele jeito, tão pouca, decerto que era orgulho. Jovens demais não são assim, tão cheios de si. Não o digo senhor porque, tendo vinte e poucos anos há mais que eu, não o enxergava de maneira senil, como enxergo ao meu avô, mas de maneira proximal demais como quem observa uma paixãozinha, dessas passageiras, ou como quem vê um amigo quase-irmão.
retratos em texto de criação escrita, poética e estética, de quaisquer assuntos que possam ser relatados e descritos em imagem.